6 de jun. de 2013

Sobre as novas faces da velha indignação

Definitivamente tem alguma coisa muito errada comigo.
Não é possível que seja normal uma pessoa encontrar tanta dificuldade em entender algumas coisas que acontecem ao redor. Mesmo que a abrangência do termo “ao redor” tenha um raio que extrapole minha própria privada.
Sabe, gosto de filmes. Gosto das produções hollywoodianas, inclusive. E gosto do Al Pacino. Mas, apesar da ótima atuação desse ator em “Perfume de mulher”, não gosto desse filme. Não gosto desse tipo de enredo. Não gosto de obras que se esforçam para consolidar ainda mais a mentalidade corporativista,  que predomina nos EUA e que se fortalece cada vez mais no Brasil. Mentalidade essa que transfere toda culpa e responsabilidade das consequências para uma pessoa que, sabendo que um amigo, colega de trabalho, ou mesmo membro da família, esteja cometendo um ato ilegal ou criminoso, denuncia-o às autoridades.
E o que acontece com a maioria dos conselhos e ordem profissionais, na maioria dos casos em que algum inscrito devesse ser responsabilizado por um ato irresponsável, de má-fé ou, pior, em caso de crime cometido deliberadamente.
É a mesma regra que prevalece entre os criminosos. “Caguete, delator, X-9 vai pro microondas”. Quem denuncia morre cruelmente, para mostrar a quem fica vivo o valor da fidelidade.
A regra é mesma para os criminosos dos morros cariocas, para os criminosos engravatados de Brasília, para os médicos, os advogados, os engenheiros.
Os pares estão sempre encobrindo os crimes um dos outros, e tudo fica bem.
É assim que tem que ser. E ainda chamam a isso de ética classista. E tentam incutir que esse é o comportamento mais socialmente saudável. E Al Pacino se prestou a isso em 1992.
Outra coisa que não consigo entender é a grande necessidade que temos de compartimentalizar algumas coisas que deveriam ser uma só. Ainda mais quando meus limitados olhos me mostram que, em alguns casos, isso é feito apenas para burocratizar alguns processos.
Por exemplo, a educação. Em minha opinião Educação é, ou deveria ser Educação. Ampla, abrangente, universalizante. Que conseguisse nos preparar para a vida, de modo completo. Nos formando cidadãos pensantes, seres sociais e nos capacitando a atuar profissionalmente, sem apartar essas coisas. Mas o que temos, de fato? Uma educação que prepara jovens para responder questões em concursos, mas que sabem cada vez menos viver em sociedade. Ou uma educação que formam seres quase autômatos, ótimos executores de tarefas técnicas, mas sem nenhuma capacidade de pensar a solução dos problemas sociais e sem o menor senso de pertencimento social. (E citei apenas as etapas finais da educação formal).
Mas não são os problemas educacionais que estão me angustiando hoje. São os arranjos, divisões e burocracias de outro princípio social que vem sendo, ao longo do tempo, utilizados para favorecer alguns poucos. Estou falando do esfacelamento proposital e conveniente que, aqui no Brasil, fizeram, e fazem na combinação “leis e justiça”.
Há algum tempo, ao descobrir que um membro da minha família estava cometendo um ato que prejudicava os demais membros, fui falar com ele, e percebi a chateação dele com a situação e a raiva comigo. Mas ele não ficou chateado por estar cometendo a referida “contravenção”. Nem, tampouco, se arrependeu por isso. Mas ficou profundamente chateado, por eu ter descoberto. Como se não bastasse, ainda tentou me fazer sentir culpa pelas consequências. Como se o erro não fosse o crime cometido, mas o fato de descobrir.
Vivenciar isso em âmbito familiar, com fatos não tão graves, e sem causar prejuízo a muita gente já foi muito frustrante pra mim. Afinal, quais valores aprendemos, e disseminamos hoje em dia, para alguém achar que cometer um ato ilegal (em qualquer esfera) tudo bem. Mas ser descoberto é um erro de quem descobriu, e esse sim, deve ser punido?
Em maio último, mais uma vez os jornais noticiaram a ampliação desse fato. Não em escala familiar, mas em escala nacional. Jornalistas, juristas e contraventores, incluindo senador cassado e “empresário dos jogos de azar” dão  como certa a possibilidade de tornarem nulas as provas colhidas na operação Monte Carlo da PF. E isso não por que foram criadas de forma fraudulentas, ou por que alguém foi coagido a produzi-las, nem por que elas não provam nada (afinal, pelo que chegou até mim, seus conteúdos provam sim, as contravenções). Mas as provas podem ser consideradas “ilegais” apenas por uma disputa de ego entre diferentes esferas da justiça.
Mas, como assim? A justiça não deveria ser uma só, com seus agentes agindo de forma colaborativos e com todos os esforços sendo somados na construção de uma sociedade mais justa.
Tudo bem, eu não sou juiz, nem senador corrupto (desculpem a redundância), nem bicheiro ou dono de máquinas caça-níqueis, nem jornalista, nem advogado, nem apresentadora de programa sensacionalista na TV, nem comentarista esportivo ou pastor/deputado. Sou apenas uma pessoa comum (veja que eu disse “pessoa comum” e não “cidadão comum” pois, da forma que as coisas estão no Brasil, não tenho mais certeza se posso me considerar um). E sou um apessoa comum, limitado, com pouco conhecimentos das leis, que recebe apenas as informações que permitem que cheguem até mim, que ingere apenas o que não serve para nossas elites e que só pode ir até onde a presença não incomoda. Enfim, sou uma pessoa comum, como a grande maioria das pessoas que constroem essa nação, que trabalha a vida toda em troca de uma miséria que mal garante a sobrevivência e que se embriaga com o álcool e o circo que nos dão. E que, apesar de tudo, ainda somos currados diariamente. Currados politicamente, educacionalmente, previdenciariamente, etc...
E, mesmo assim, e exatamente por ser essa pessoa, é que não consigo aceitar que vale menos o conteúdo de uma prova mostrando um bando de gente roubando a população, zombando das nossas caras, cagando no futuro de nossas crianças, do que uma divisão idiota, criada para proteger bandidos engravatados, que conseguem manipular esquemas financeiros, que compra e ameaça pessoas, para serem eleitos.
A mim não importa se foi a guarda municipal do Faina ou o STF que levantou alguma prova. Se ela mostrar alguém cometendo um crime, essa pessoa deve ser punida, como preconiza as leis.
Aqui, desse meu limitado e insignificante mundo só consigo enxergar que todos que ocupam algum cargo no judiciário e no legislativo agem apenas conforme os interesses dos pequenos grupos que representam e de quem recebem as ordens e seus salários.
Ao contrário das polícias, onde ainda conseguimos ver gente lutando, sem as condições mínimas desejáveis, para combater uma parcela dos crimes. Por vezes usando o próprio corpo como escudo, e deixando órfãos suas esposas e filhos. Lá, no alto comando dos compartimentalizados órgãos do legislativo e do judiciário não consigo ver ninguém, absolutamente ninguém, interessado em cumprir de forma isenta o papel para o qual, teoricamente foi colocado lá pra fazer.
Quisera ser como Churchill, para formular uma frase altamente carregada de ironia. Mas não sou...
E ainda tem gente querendo reduzir a idade penal


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