28 de nov. de 2010

E eu nem sou Adoniran...

E assim, sem motivos algum, ou mesmo me conhecer,

Talvez até sem intenção (mas não sem vontade)

Deu pra me atacar.

E me sinto penetrado, dilacerado.

Revirado de toda forma.

Armas? Nenhuma

Apenas esse seu penetrante

E fatal olhar.

Motivos para tantas lembranças e saudades.

Apesar de admirar muito o Belchior, e ter nele um exemplo de letrista e compositor, tenho clara noção de que vou precisar de muitas vidas para me aproximar do jeito que ele compõe. Apesar disso, e inspirado nele, também me sinto obrigado a responder uma carta (no meu caso, um "scrap") de um amigo (no caso dele, foi de fã). Aqui está...

Os campos da minha infância eram mais floridos sim.
Com multicores margaridas.
As águas dos velhos riachos eram puras e cristalinas.
No tempo certo, colhia-se mais frutos no cerrado que nos pomares e quintais.
Aliás o mundo todo era nosso quintal.
Nosso campinho, nossa pista de pega-pega.
Em algum lugar havia ditadura, com generais desumanos (e idiotas) mandando em tudo (acho que se chamava Brasília esse lugar).
Mas lá, em meu enorme mundo real éramos livres.
E ainda sou (não totalmente, pois cresci, e adultos não sabem bem como é isso...)
É, meu amigo. O jeito simples dos meus pais;
A existência de alguns padres, umas professoras; certos negros generosos e carinhosos;
Uns poucos amigos que foram/são mais que irmãos;
Algumas Marias, pequenas e nenéns;
Famílias que adotei como minhas e que me adotaram também;
Os beijos dados e os que não aconteceram;
Alguns “sins”, e muitos foras;
Tirinhas do Papa-capim e do Chico Bento, e revistas de humor escrachado e sem noção; Muitas viagens, umas felizes e outras bem tristes;
Algumas “viagens” bem malucas;
Porres e ressacas; Teatros e corais;
Palavras de ordem e gritos de guerra;
Coreografias ridículas e cânticos de fé;
Defesas dos direitos e pequenas infrações;
Sonhos sagrados e desejos profanos;
Surpresas agradáveis e decepções.
Tudo isso, meu amigo. Mas, sobretudo a certeza de ter vivido a vida no máximo de minhas possibilidades, e ter sido pleno, é que moldou o “Naza” que te escreve agora.
Sim. Sou saudosista sim!
Mas não vivo no passado.
Gosto de me lembrar sim.
E sinto essa saudade gostosa.
Mas se me esforço para manter vivas as lembranças do que vivi, é para não perder de vista o garoto pobre de pés descalços e livre, que um dia fui, lá na baixadinha.
E para não errar muito na avaliação atual sobre esse cara que hoje vive na capital, mas que não é máquina e não quer deixar de sentir, pensar e amar como as “gentes” de verdade que conheceu pela vida.
É por isso, meu amigo.
E saiba, o “Naza” de hoje so existe porque vários outros “Nazas” viveram todos esses momentos, e se transformaram, cresceram e deixaram de existir para que todos pudessem ser esse eu.
Mas não se preocupe, nem se anime. So estarei contigo nesse momento.
Logo Também não estarei mais aqui.
E outro “Naza” falará com você, lembrando desse meu sorriso, idiota mas verdadeiro, que é lavado por essa lágrima feliz.
Sei que estou aqui, e esse é o melhor momento para se viver. Mas para saber disso, e ter a mínima capacidade de aproveitar o agora, eu devo a todos os passados.
A todos os você que foram para você existir, meu carinhoso abraço. Espero que em algum lugar do seu presente, ainda existam traços de lembranças dos outros você, que um dia foi...

Boa dica de presente

Final de ano, festas, renovação de sonhos, confraternização e troca de presentes.
Aqui uma ótima sugestão para presentear colegas de trabalho, familiares, amigo oculto, chefe, funcionário, pessoa que se pretende conquistar, moça simpática do caixa do mercadinho da esquina, jornaleiro gentil...
Enfim, para todas as pessoas.



Por apenas R$ 15,00 você tem certeza de agradar a você mesmo e a todos.
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Conta para depósito:
Titular: Nazareno de Sousa Santos
Banco do Brasil
Agência: 3607-2
CC.: 35.530-5

Todos os pedidos feitos até o final de dezembro será enviado com frete grátis para todo Brasil.

Inexorável Rota Insana

O despertador não dá trégua. Toca, toca, toca. Insistente, barulhento, ecoando pelos quatro cômodos da pequena casa situada no Jardim Novo Mundo, em Goiânia. Melhor não resistir, apesar do desejo enorme de não sair da cama. São seis da manhã, e a professora precisa encontrar forças em alguma parte do seu ser para enfrentar mais uma semana que, certamente não será diferente das demais. Está cada vez mais presente o forte desejo de parar de vez com o magistério. A total falta de interesse da maioria dos seus alunos somada à duradoura desvalorização, e desrespeito da classe pelos governantes, e donos-vis de escolas, funcionam cada vez mais como desestimulantes. Mas parar como? O que poderia fazer agora, se lecionar é o que ela tem feito por longos 23 anos? Não tem saída, vai resmungando como sempre faz todas as manhãs, sobretudos nas segundas-feiras, mas vai resignadamente se dirigir à escola municipal ministrar aulas de geografia e história as séries finais do ensino fundamental. “Só mais alguns anos e me aposento”, é o pensamento que tem servido como falso refúgio para acalmar sua alma que já não se excita com mais nada nessa vida. Na rua os carros sonorizam o início da rotina, as buzinas ditam o ritmo frenético, por toda parte diversos sons urbanos preenchem os espaços, nos lembrando que já é mesmo hora de acordar. Afinal o dia já começou, e é segunda-feira. A desiludida professora, sem um pensamento feliz que seja, se veste sem empolgação, escova os dentes amarelados pela nicotina, prende o cabelo com uma liga bastante gasta, pega sua bolsa com os diários desse ano, os livros que há cinco anos usa algumas páginas fotocopiadas e saí. Segue para o terminal do Eixo Anhanguera, se aperta no ônibus que a levará até quase atravessando completamente a cidade, numa viagem de quase meia hora, para chegar ao terminal Padre Pelágio. A escola em que trabalha fica próximo à rodovia dos Romeiros, que leva à Trindade. “Lá vou cumprir mais uma penitência social”. Pensa consigo!

Muito longe de Goiânia, no Mato Grosso, às margens do Rio Taquari, próximo à cidade de Alto Taquari, existe um povoado, distrito de Alto Araguaia. Lugar chamado de Vila do Buriti, há lá uma mercearia, uma escola com poucos alunos, um boteco, um telefone público, ou dois, e não mais que duas centenas de moradores. É lugar tranquilo, com pessoas acomodadas, para se chegar lá, é necessário descer a perigosa Serra Preta, se está indo das bandas de Alto Taquari, ou enfrentar a estrada com intermináveis bancos de areia, se o aventureiro vem dos lados de Alcinópolis e Coxim, no Mato Grosso do Sul. Nesse lugar, no mesmo momento que professores de Goiânia seguem em ônibus lotados para suas salas de aulas, uma velha senhora está de pé, preparando um café cujo aroma pode ser sentido não só na cozinha, mas no quarto pequeno e no banheiro úmido e lodoso, que compõem sua pequena morada. Ela também não sorri. Não conversa. Não reclama. Não faz planos pra hoje. E não se lembra de quase nada. Mas isso foi uma escolha feita há vários anos. Ela apenas passa seu café em seu velho coador de pano borrado, senta-se sozinha, como faz todos os dias e toma seu café sem nenhuma pressa. Afinal não faz a menos diferença que dia é hoje. Na verdade ela nem sabe que é segunda-feira. A única coisa que ela vai fazer em mais esse dia é esperar. Esperar que anoiteça e, principalmente, que uma certa visita finalmente venha lhe ver. Teve cansaço, irritação, ressaca, dores de cabeça, corrida aos bancos, para cobrir os gastos do final de semana. O transito foi, como sempre, infernal. O dia pareceu maior do que realmente é. Tudo isso por que é segunda-feira. A noite encontrou uma professora desiludida, corrigindo provas em sua casa na periferia de Goiânia. Na Vila do Buriti, uma velha sozinha, com sua TV de 20 polegadas com seletor e válvulas em preto e branco, não mostra nada interessante. Ela não recebeu a visita que tanto deseja. Não recebeu cartas, não recebeu notícias de quem quer que fosse. Não chorou nem sorriu. Apenas esteve ali, em mais um dia. Uma segunda-feira.
Às treze horas uma jovem e bela enfermeira, em início de carreira verifica os sinais vitais dos pacientes de sua ala, no Hospital Albert Einstein. Mineira de Araguari, morena, 21 anos, formou-se há menos de 4 meses conseguindo o que considera o estágio dos sonhos. Autoconfiante sabe que terá uma carreira brilhante devido à profissão que escolheu. Morar sozinha em São Paulo, não mais depender da mesada que seus pais ainda mandam é uma demonstração clara de que estava no caminho certo. Tem também o novo namorado, jovem e promissor engenheiro, que a trata como sempre imaginou. É uma pessoa realmente feliz e está num bom momento de sua existência. Nada, nem mesmo o fato de ter que limpar excrementos de pacientes idosos, é capaz de estragar seu dia. Nenhum dia. Inclusive nessa terça-feira. No Mato Grosso, a aziada velha, moradora da Vila do Buriti, como acontece em quase todos os dias, não sai de casa. Sequer vai ao seu portão. Só vê a luz do sol pela janela de madeira, que abre para deixar sair um pouco o mau cheiro do seu banheiro imundo. E, novamente, nenhuma visita vem lhe ver. Nada muito interessante, nesse dia. A bonita enfermeira prossegue otimista, vivendo amando e aprendendo. Enquanto a lastimosa velha vê passar mais um dia. É assim. E assim foi mais uma terça-feira.
Noite de jogo. Escalado pela primeira vez como titular, o zagueiro está ansioso, apesar disso confiante. Jovem, filho de agricultores extrativista, sempre gostou muito de futebol, como todo garoto. Quando criança era apenas diversão. Mas sua ginga despertou interesse no treinador da escolinha do Andirá Esporte Clube, onde começou nas categorias de base. Agora está ali, vestindo o uniforme verde-negro. O Estádio José de Melo não está exatamente lotado, tampouco é decisão. A temporada do campeonato acreano está no início más, para ele que inicia jogando pela primeira vez, a sensação é de que todos os torcedores de Rio Branco estão lhe olhando. Ele termina de amarrar a chuteira e, antes da preleção final do treinador, procura um canto do vestiário e, sozinho, faz sua prece silenciosa.
No vale do Taquari, a noite encontra aquela resignada velha que novamente passou o dia como se não o fizesse. Ela se deita, sem esboçar sorrisos e sem chorar. Não vê motivos para nada. Nenhum sentimento lhe toca. Sente aquela sensação de ataraxia defendida pelos filósofos estóicos de Atenas. Apenas deita. Se deita apenas por ser noite, afinal não tem vontade. Foi mais um dia sem a sinistra visita que aguarda. Em Rio Branco o jogo prossegue. A atuação do jovem zagueiro é modesta, mas ele acredita que agora pode se firmar como titular. Certamente não acabará sua vida como seus pais, coletando açaí e castanha. E quem sabe poderá até conseguir alguns contratos com times do Rio, o de Janeiro ou São Paulo, se assim fosse ficaria rico. Ser convocado para a Seleção. Morar na Europa. Tornar-se pop star. Ficar rico. Agora seus dias não mais seriam iguais. Ao contrário dos dias da amarga velha da Vila do Buriti. Para ela, mais um dia chega ao fim. Um dia qualquer. Para ele, esse dia ficará marcado para sempre. Afinal é dia de futebol. É quarta-feira. Foi quarta-feira.
Corrupto, o velho Senador com 79 anos da novíssima República se esforça para aprovar seu projeto que beneficia diretamente um grande empreiteiro, de quem receberá uma generosa propina. É quase um Cícero na tribuna. Tem grande capacidade de persuasão sendo ardiloso articulista. Para ele não é difícil convencer seus pares da CCJ afinal 3/5 dos insignes parlamentares lhe devem favores pessoais. Para ele é uma grande vitória, e acredita que no plenário não terá problemas também. Numa ligação, ele fala com seu corruptor obtendo a confirmação de que os milhões acordados serão transferidos para as contas das pessoas por ele indicado. Após o almoço passa no gabinete assinando documentos, passando instruções aos assessores. Do aeroporto JK embarca no meio da tarde para o Maranhão, uma vez que o expediente da semana já se encerrou. Afinal é quinta-feira. Na vila do Buriti, a casmurra mulher lava as poucas roupas que possui, sem capricho, sem preguiça, sem vontade. Sem nada. Apenas lava. A maldita visita não veio hoje, e ao que parece não vem mesmo. Naquele final de dia o Congresso Nacional está praticamente vazio. Nenhum Deputado e tampouco Senadores estão mais em Brasília, por fim no Planalto Central a semana termina na quinta-feira. E tanto no DF quanto na divisa do planalto do Cerrado com a planície pantaneira, a sisuda velha vive sozinha, sendo proprietária de apenas uns poucos trapos para lavar, ela encara a si mesma de forma totalmente díspar de um senador corrupto, hoje é quinta-feira.
Ah! A sexta-feira, dia internacional da cerveja. Dia em que os jovens iniciam a odisséia dionisíaca do final de semana quando acontece the best in happy hour the city. Todos esperam parar mais cedo indo logo p`rum bar começando ainda com sol a azaração. Na Avenida Cesário de Melo, nº 3226, em Campo Grande, no Rio de Janeiro, no entanto um experiente segundo sargento bombeiro está de serviço, e sabe que o dia será carregado de ocorrências, urgências e emergências. É assim todas as sextas-feiras, muitos acidentes e o grupamento do Auto Socorro de Emergência não tem folga. Os poucos momentos entre um salvamento e outro é preenchido na tentativa de manter o controle emocional relaxando o mínimo possível conforme o estado de sempre alerta.
Quando o sol começa a se por, e a noite começa a se apresentar, a situação se torna muito mais tensa. Irresponsáveis motoristas bêbados se matam. Matam pessoas que nem participaram de sua comemoração, ou de sua mágoa, que não beberam com eles. Desiludidos que resolvem não querem mais viver. Tem aqueles que imaginam ter o direito de interromper a vida de outros. “Balas perdidas”, reação a assaltos, guerra da polícia contra traficantes. A criança que se engasga com qualquer coisa que mal caiba na boca, e não passa pela garganta. O gatinho que ficou preso no alto de alguma árvore. Tudo isso torna as sextas-feiras dias muito cansativos para os bombeiros. E nesse dia não é diferente. O segundo sargento não reclama, a menos que não consiga salvar uma vida, mas não vê a hora de deixar o turno, quando a noite de sexta-feira acabar. Enquanto isso não acontece, segue ele atendendo todas as chamadas com presteza, eficiência e boa vontade. Na Vila do Buriti, a pacata velha dorme, depois de um dia intensamente vazio quanto os demais. Um brinde. Afinal é sexta-feira!
O Sol nasce, e um chicleteiro chega em casa na manhã de sábado, depois de uma noite inteira passada ao som de muito axé e centenas de beijos na boca. Beijos rápidos, sem envolvimento em pessoas de quem ele não sabe o nome, e certamente nunca mais saberá. Cheio de tanto vazio, ele chega pra dormir. Está feliz. Ele mereceu, depois de uma semana cheia de trabalho no escritório de contabilidade onde é escriturário, a festa no Bairro da Liberdade foi um ótimo programa. E agora, mesmo morando ali, pertinho da praia de Jaguaribe, não quer saber de mar. Ele cai na cama e logo adormece. Provavelmente passará o dia na cama. Pode, até mesmo, emendar com a noite que virá. Não tem, e não quer obrigações nesse dia, afinal é sábado. A cordata velha da Vila do Buriti não se importa se é sábado ou inverno. Ela faz as coisas de sempre. Toma seu café passado no coador de flanela. Assiste o dia passar, sem esboçar sentimentos, novamente nenhuma peculiar visita. Em todo canto de Salvador se ouve música. A capital baiana é uma festa, de vários ritmos, para todas as tribos. Mas aquele contador-chicleteiro não vai sair da cama. Afinal é sábado.
Em Juazeiro do Norte o domingo é dia de missa, para muitos fiéis de visita à estátua de Padre Cícero. Devotas e devotos de todas as idades, cidades e intimidades aproveitam o dia para demonstrar sua fé. Agradecer por graças recebidas e pedir novas intervenções do santo cearense.
Em Goiânia aquela vassala professora desejando apenas se aposentar, perde seu tempo vendo programas na televisão. Uma jovem enfermeira e seu namorado visitam o MASP e depois caminha pela cidade que está vazia, e sem chuva. No Acre um jovem zagueiro está no banco de reservas do Andirá Esporte Clube, mas sabe que entrará no segundo tempo da partida contra o Plácido de Castro enquanto o ímprobo Senador da República pelo Maranhão, recebe alguns companheiros de partido, empreiteiros e membros do Palácio dos Leões para um churrasco, regado à cerveja alemã e azeite lusitano, claro com a presença de algumas bonitas mocetonas, monetariamente atraídas para “animar” a festinha. No Rio, um segundo sargento bombeiro aproveita o domingo de folga para ir com a esposa e o filho adolescente remar na lagoa Rodrigo de Freitas. Em Salvador, no Mangue Seco de Tieta, os salva-vidas não conseguem socorrer um jovem arrastado pelas ondas. Ao ser retirado do mar, o chicleteiro escriturário já não respira. Ninguém sabe como pode ser, já que ele era excelente nadador. Não farão necropsia, e jamais saberão que foi seu jovial coração que decidiu parar de bater, naquela tarde de domingo.
Enquanto isso, a macambúzia velha vivente sozinha na Vila do Buriti, vê o dia arrastado passar. Ela não se importa com nada. Às vezes se lembra do marido morto há alguns anos, e do filho que se mudou ainda garoto, para Campo Grande, sem jamais dar notícias. Conformou-se logo, com a idéia entendida como sina das mulheres a condição de ficar sozinha quando se envelhece. Seu filho se foi pra longe, e não lhe deu nenhum neto. Ele tornou-se pai de dois filhos, entretanto nunca trouxe nenhum deles para conhecer a solitária avó. Ela vive ali, sozinha. Não vai à igreja. Não quer mais saber de conversar com os vizinhos. As poucas saídas são pra ir à mercearia quando precisa comprar mantimento. Além disso, não arreda pé de casa. Não quer correr o risco de sua visita aparecer e não encontrá-la. Nessa tarde ela está lá, sentada, olhando pela janela, enquanto espera o dia passar, e a visita aparecer.
A noite chega. Algumas pessoas vão pra rua, aproveitar os últimos instantes do final de semana, outros continuam perdendo tempo de frente à TV, outros choram os entes perdidos. Nas igrejas poucos fiéis oram, rezam, estudam, pedem e agradece. Mas na Vila do Buriti o cheiro de gordura do jantar simples se mistura com o do banheiro imundo e com o sempre presente aroma de café. Enquanto se prepara para deitar a acabrunhada velha, em um raro momento, deixa escapar um pensamento, que nos faz entender o sentido que sua vida tem agora: “Ô meu Deus, até quando ainda terei que esperar para que a morte venha me visitar?”. É domingo!
Daqui a pouco será segunda-feira novamente. A semana recomeça e a rotina se repete. A vida continuará seguindo seu curso, inclusive na Vila do Buriti, para a amargurada velha já muito cansada de viver a espera do corte do fio das Moiras.

11 de nov. de 2010

Festejando...

Eu não sou Baleiro,
Oswaldo tampouco sou
Jorge não é meu nome,
E se não sei djavanear
Como é que posso cantar o amor?
Esse que está aqui, e pulsa forte
Que está em mim, e me faz vibrar
Me torna vivo, como energia
Me revigora, como alimentar
Que me faz sorrir,
Como ouvir histórias
De homens ao mar,
De veredas e sertões,
Ou “causos” de assombrar.
Como ouvir poesias de qualquer “Pessoa”
Ou letras brejeiras de uma certa Cora.
E se Florbela “Espanca” corações errantes,
Hilda reconstrói, como ao recriar
A descontinuidade de uma flauta doce.
Sendo assim reforço,
“À quem interessar possa”:
Mesmo que o abraço bom da boa anciã
Que ainda é “Pequena”,
Ou o doce gostoso da negra “Neném”,
Não me adocem a vida
Ainda vou deixar voz exposta
Em muitas canções,
Mesmo que sem ritmo
Ou desafinada
Pois o bom da vida,
Essa que é real,
É saber-se gente
E celebrar sem medo.
Mesmo que nem sempre o céu esteja azul,
E os poemas sumam,
Ou fiquem tão escassos.
Que as crianças livres,
Parem de correr nos campos.
Ou não tenha lua, pra romancear,
Nem flores roubadas, para te alegrar.
Pois, se um dia do outro nunca é igual,
Sempre vai haver “São João”,
Depois do Carnaval.

Jardineiro

Inda que me fira, às vezes,

Com alguns espinhos,

As minhas roseiras eu vou cultivar.

Pois o pouco sangue,

e a pequena dor

Sempre são menores que o bom perfume

E a combinação perfeita

De textura e cor.

10 de nov. de 2010

Quíchua

Ironia irritantemente agradável,

Humor docemente ácido,

Sagacidade típica de quem exercita mais a mente que o corpo.

E essa sinceridade assustadoramente bem vinda.

Explicitamente bela,

Com nuances deliciosamente sutis.

Jeito maliciosamente puro

Sorriso maroto,

Olhar esperto,

Fala segura

Comportamento delicadamente maduro.

Nome de imperatriz,

Porte de rainha e,

Potencial para deusa.

Com seus anjos e demônios.

Mesmo sendo assim, tão menina e tão mulher.

Seja em Aparecida, em Cuzco, Canedo,

ou aqui!

Excelente companhia pra se ter.

E, veja que sorte a minha,

Que um belo, simplesmente (assim).

Encontrei você!

9 de nov. de 2010

Distorcida sintonia...

Não teve música preenchendo o ambiente.
A luz não mudou de cor,
(O Arco-íris, claro, não surgiu).
Nem fizeram pausas dramáticas.
É, a vida não é mesmo como nas novelas,
Tampouco como no cinema.
(E não é irônico ou romântico.
Tem apenas o a intensidade dos sentimentos).
E, se encontraram.
Depois de tudo
(e tanto tempo).
Fingiram alegria,
Ele quis até sorrir...
(...)
Palavras soltas,
“Como tem passado?”
Cerveja amarga.
Minutos longos.
Por fim, um beijo no rosto
(frio, pesado...
Mais suave teria sido um soco).
Despedida amena.
Votos comuns
(... felicidades...)
Indiferença...
Lembrou-se de um tempo em que acreditou que eles formavam “nós”.
E de quando descobriu que, por acreditar sozinho,
Ele era apenas “eu”.
(...)
As lágrimas?
Não foram pelo que eles são agora,
Nem pelo que poderiam ter sido.
Mas pelo que fizeram deles,
Pelo que fizemos com eles.
Pelo que ela fez
Pelas escolhas tortas.
Pelos planos abandonados,
E acordos quebrados.
Foram por tantos passos abandonados no meio do salão
(antes que a música terminasse).
E, por nem ao menos, sentir raiva.
Mas por tamanha indiferença.
Por ver toda aquela magia (que imaginou um dia)
Totalmente morta...
(...)
E seguiram, sem música pra embalar
o caminho em que seguiam.
Más por certo havia música.
Só não conseguiram perceber,
Por conta dessa
Distorcida sintonia.
.............

3 de nov. de 2010

2 de nov. de 2010

Apenas quero...

Hoje eu quero apenas tudo.

Que seja de bom,

Que seja do bem.

Quero cantar,

Falar, com você!

Me encantar outra vez.

E outra vez querer o novo.

Que seja parecido com o que já foi,

Ou com o que nunca será.

Que seja.

Olhe ao lado.

Olha-me.

Veja o que sinto.

Veja tudo,

Ou não veja.

Apenas venha aqui.

Não diga nada,

Mas queira tudo e,

Agora, simplesmente me beija

A companhia, e já basta...

Nem precisar ter o beijo!

Sexo é bom, mas nem é o que mais importa.

Pode até não ter abraço.

É mesmo meio bobo esse meu afeto,

Pois o que quero mesmo

É ter você, sempre aqui.

Sempre perto.