4 de mar. de 2012

Foi há muito tempo.
O ano não me lembro mais.
Lembro que era tarde e chovia.
Apesar disso, brincava na rua, como criança adora.
E, apesar do tempo, do clima, da chuva e da pouca idade,
Você veio.
Era linda,
Era doce.
Lama nos cabelos
Sorriso bobo nos lábios
Sem as curvas que viria a ter.
Era linda.
Era pura.
Era travessa.
Enormes olhos cinzas.
(“olho de husky”, eu dizia).
Brincávamos na chuva, em uma tarde qualquer, naquele nosso velho outono.
Tava dia mas fazia escuro, pois chovia.
E você, com lama em seus cabelos loiros e embaraçados, veio.
Não era sua vez.
Outro garoto era o pegador.
Mesmo assim você veio.
Nunca vou entendo quais caminhos nos levaram até aquela tarde
Em que chovia e era quase noite.
Quando, sem aviso, sem preparar minha alma de garoto,
Sem nada que me alertasse de sua vinda,
Você apenas veio.
Apesar do tempo (e aquele agora, já ficou tão distante...).
Apesar da chuva, da penumbra em pleno dia,
Do meu cabelo ralo e ressacado,
Apesar do meu jeito franzino
Apesar, até, do outro garoto, grande e forte
Foi a mim que você veio.
E sem deixar nenhuma escolha, decretou meu destino.
Parou bem em frente a mim.
Olhou-me nos olhos, com seus olhos de husky,
Passou suas mãos cheias de barro em meu rosto
Sorriu, mostrando as falhas nos dentes de criança,
E docemente decretou: “Cê precisa saber uma coisa, vou me casar com você”.
Foi há tanto tempo.
Nem me lembro mais o ano.
Sei que chovia e era quase noite.
E eu, garoto ingênuo, com seis ou sete anos, congelei por um momento.
Não foi o frio da chuva,
Nem o medo da noite.
Foi por perceber que aquele decreto iria ser cumprido por nossos destinos
Afinal, eu também já sabia.
E, daquela tarde chuvosa,
A partir daquele dia quase noite,
Eu nunca mais estive sozinho.
Aquela doce garotinha com grandes olhos cinza, esteve ao meu lado em todos os momentos. Me ensinando a ser livre e me mostrando como ser feliz.
E tudo o que fiz foi para merecer, cada vez mais, aquela profecia.
Já não brinco mais na chuva
Você não tem mais os cabelos embaraçados.
Eu, nem cabelo tenho.
Não corremos mais na rua, como em nossos velhos outonos.
Mas vejo ali, na chuva, brincando como nós, nossa terceira geração
E me sinto congelar.
Não de frio,
Não de medo do escuro, pois é dia.
Mas por sentir que acho ter merecido.
E por perceber que tanto quanto naquela tarde, continuo querendo me casar com você, a cada novo dia, a cada nova chuva, a cada novo afago.
Não há na Terra nada que eu ame mais que você, minha linda e doce garotinha com belos olhos de husky.

3 comentários: