Ao escolhermos um voo, ou um ônibus, no
qual embarcar, sabemos previamente de todo itinerário. Conhecemos o roteiro,
sabemos quantas escalas faremos, e quanto tempo levará até a chegada ao
destino. Tudo é preciso, planejado e conhecido. Cabe a cada um aproveitar, à
sua maneira, a viagem.
Quando embarcamos na vida, no entanto,
não temos nenhum roteiro prévio. Não conhecemos o roteiro, nem sabemos se
haverão escalas, ou quantas serão. Quanto tempo em cada estação? Só saberemos
quando de lá estivermos partindo. E, quais serão os nossos companheiros de
viagem, também não sabemos. Vamos conhecendo pelo caminho.
Mas, também nesse caso, cabe a cada um
aproveitar, também à sua maneira, sua viagem.
Por vezes nossa estrada cruzará a de
outros viajantes. Às vezes mais de uma vez. Em certas ocasiões permaneceremos
na mesma estação por algum tempo. Para, depois nos separarmos (às vezes com
certo pesar, ou mesmo com muita dor).
E, como o roteiro não está previamente
definido (ao menos não o conhecemos), podemos ir decidindo qual será o próximo
destino a cada nova estação. E aqui se encontra a nossa única possibilidade de
decisão nessa jornada. Escolhemos qual a próxima direção a ser tomada. Mas não
temos nenhuma ideia de onde ela nos levará. Muito menos como será essa viagem
(pois o trajeto é sempre mais importante que o porto onde aportaremos).
Para facilitar um pouco nossa vida
tomamos o tempo que esse frágil planetinha azul leva para dar uma volta em
torno da estrela que o aquece, como delimitador do tempo, após o qual
convencionamos que devemos avaliar tudo que já percorremos até aqui, e para
planejar os próximos passos. Mas, como assim, planejar? Se não podemos definir
os detalhes dessa viagem.
A cada novo ano, esperamos que tenhamos,
cada um de nós, aprendido coisas novas. Coisas que, mesmo que não nos torne
mais "maduros", ao menos tenham agregado em nós conhecimento
suficiente para não cometermos os mesmo erros, e para aceitar que cometeremos
vários outros, e será exatamente isso que nos proporcionará mais crescimento.
Hoje, ao analisar meus próprios
"balanços" anteriores (e também de quase todos que me chegam),
percebo quanto egoístas eles costumam ser. Ao avaliar um ano que acaba, pouco
importa se foi bom para a coletividade. Se para mim não foi assim tão bom,
então avalio negativamente. Um bom ano, no ponto de vista de cada um, se refere
apenas sobre como o ano foi para essa pessoa. E não para ela inserida em um
grupo maior, que convencionamos a chamar de sociedade. Por outro lado, se minha
fortuna é maior ao fim de dezembro, do que era em janeiro, então digo que o ano
foi bom. Mesmo que todos em minha volta tenham perdido tudo que possuíam (às
vezes para que minha riqueza aumentasse).
Os anos, e todas as estações percorridas
por todas nós em cada um deles, eu espero que nos tornem pessoas, que consigam
identificar cada vez mais o grande laço
que nos une ao planeta. É necessário que a cada novo dia percebamos, e
aceitemos, que não somos, nem vivemos em ilhas.
E é com esse sentimento que procuro
externar o sentimento que tenho, ao findar de mais uma volta de nossa humilde
casa em torno de seu orgulhoso par, nessa dança vital.
2014 não foi um ano fácil. Nem para nós.
Nem para os deuses. Eles tiveram que reforçar o time, e levaram daqui alguns
dos nossos melhores craques, como nosso primeiro, e maior funkeiro Jair
Rodrigues; O poeta menino João Ubaldo, Gabriel Garcial, esse colombiano
universal; O humilde Canarinho; Suassuna, esse criador de ilusões; O heroico
Rafa Soares; Joe Cocker; O último dos Ramones; Até Roberto Bolanõs cismou de,
"sem querer querendo", partir daqui.
Mas o ano também reforçou a presença de
alguns seres quase iluminados entre nós, o que, ao menos em mim, ajuda a
reacender a esperança na raça. Existem mais de uma dúzia desses, mas como
alguns são completamente desconhecidos (como de fato eles preferem ficar), vou
citar apenas os dois que mais fortemente aparecem no horizonte. (Antes um
parente para dizer que me alegro muito pelo fato de os dois maiores exemplos
vivos, ao menos pra mim, serem sul-americanos). Trata-se do Uruguaio Pepe
Mujica e do Argentino Jorge Bergoglio. Líderes que dão o melhor exemplo que se
pode esperar.
E, se para mim o ano não foi exatamente
o que esperava, afinal o velho Capézio, coitado, nem saiu da caixa, e nenhuma cachoeira me banhou, também não foi motivo para que eu o maldigue. Foi um ano cheio.
Cheio de gols indesejados, de manifestações preocupantes e de beijos
incompreendidos.
Aprendi com, e gostei do, balanço geral.
Falta muito pra todos nós. E não podemos
nos permitir certos retrocessos. Mas no geral foi bom.
E, sem querer me comprometer além das
próprias possibilidades, para 2015 não faço promessas, pois aprendi que elas
podem nos aprisionar. Mas tenho desejos e alguns sonhos.
Em primeiro, gostaria que ao final de
2015 cada pessoa, ao analisar seu ano, o faça com foco nos benefícios, e perdas
coletivas, e não apenas no individual;
Que algumas noites animadas nos tragam
ressacas físicas, e que os motivos tenham sido compartilhados com o máximo de
pessoas possível;
Que algumas noites animadas nos tragam,
também, alguma ressaca moral, mas nesse caso, que os motivos sejam apenas meus
(depois de tanto tempo aceitei que não tenho vocação para santo, nem para falso
moralista. E pagar algum mico faz sim, parte dessa viagem);
Que todos aprendamos a enxergar a
diferença entre necessidade real e as criadas pelo mercado;
Por fim, que façamos boas escolhas, e
que tenhamos muitos bons motivos (para nos alegrar, para nos orgulhar, para
crescer, para nos divertir, para sermos livres, para ficar em casa e para
sairmos, para baladas, para nos arriscar mais, para nos preocupar com o mundo,
para desejar, para nos aquietarmos e para nos agitar. Enfim que tenhamos
motivos para seguirmos vivendo plenamente, já que essa é nossa jornada, e
ninguém pode percorrê-la por nós).
Fechando, me permito compartilhar artigo publicado pelo Diário da Manhã nesse dia 30/12/2014: Leia aqui.
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