O que faço no campo de golfe é só parte do exemplo que um atleta deve dar. Mas, o caráter e a decência são as características que realmente contam. Tiger Woods
Mais um caso choca toda população brasileira.
Mais uma figura pública ocupa as páginas policiais.
Não se trata de mais um “escândalo”, desses que as revistas de fofoca tanto gostam de estampar em suas capas. Mas sim, de uma história de violência que, ao que tudo aponta, com um grau de frieza e crueldade de deixar qualquer pessoa arrepiada.
É, o goleiro Bruno, que pertencia ao Clube de Regatas do Flamengo, dificilmente se safará da “enrascada” em que se meteu.
Ao que tudo aponta, ele e os demais envolvidos, serão julgados culpados, e condenados pelo que fizeram. E, por muito tempo ocuparão as manchetes dos jornais impressos, digitais e televisivos.
Os aproveitadores das “desgraças” alheias usarão o caso para aumentarem suas vendas e suas audiências por muito tempo. E, obviamente de quase tudo se falará. A frieza do goleiro; a crueldade de todos os executores; e, mais tarde, a forma de vida da garota vitimada, e, por que não, seu possível interesse em usar o filho para se beneficiar financeiramente.
Toda essa “desgraça” mencionada será assunto em programas comandados por apresentadores que sentem grande prazer em gritarem nos microfones, e se apresentarem como os maiores (senão os únicos) defensores da justiça e da lei. Também ocupará os programas de auditório que preenchem as tardes e as noites, onde apresentadoras despreparadas debatem todo e qualquer tema, com convidados em meio a preparação de algum prato ou desfile de lingerie.
No entanto, apesar de toda repercussão que o caso está tendo e sabemos que ainda terá, temo que um dos pontos, quem sabe um dos principais, não chegará a ser abordado com o enfoque devido, muito menos com a seriedade que merece.
Estou falando de mais uma grave enfermidade que acomete a sociedade em nossos tempos. Não se trata de algo novo. Mas, a disseminação nunca esteve tão ampla, e com crescimento tão acelerado.
Em todas as culturas humanas, independente da organização política, opção religiosa, constituição legal ou conjunto de normas culturais e de costumes, uma coisa é comum. A noção de que é o respeito e valorização da família que fornece às pessoas as noções básicas, que garantem à sociedade suas qualidades.
As relações sociais serão mais ou menos saudáveis e as pessoas serão mais ou menos responsáveis, honestas e agirão com mais ou menos noção de ética e justiça, na mesma proporção em que aprendeu, pelo exemplo e pela vivência pessoal, estas, encontradas somente no âmbito de sua família.
Vendo e vivendo com toda essa violência moral e social eu pergunto, o que estamos assistindo em nossos dias? Pois, ao contrário do desejado, o que existe é uma crescente desvalorização dos princípios básicos. Em que, a família não é mais uma célula que merece nosso respeito, e, não nos causa mais orgulho constatar que temos uma que seja bem estruturada.
E há ainda um sério agravante, que considero o foco principal dessa minha conversa aqui. Trata-se de uma das principais causas pela destruição da família, que é a banalização do adultério. Como já disse, sei que esse não é um fato recente. Sempre esteve presente. Mas, não podemos negar que tem tomado proporções de epidemia, e caráter de “coisa normal”.
O problema é que ainda estamos em uma sociedade cristã, com fortes traços conservadores e não admitimos a poligamia como aceitável em nosso meio. Minha geração não inventou isso, apenas fomos criados sob esse regime.
Além de monogâmica, nossa sociedade é capitalista e se torna mais consumista a cada dia. Assim, na mesma medida em que vamos desprezando os valores éticos, vamos valorizando cada vez mais os bens matérias e a frivolidade da enorme quantidade de coisas supérfluas que o dinheiro pode comprar. Ou seja, cada vez mais nos deslumbramos com a possibilidade de satisfazer as necessidades da moda, ou nos frustramos por não conseguir comprar o que os anúncios dizem que nos é fundamental.
Além de tudo isso, continuamos sendo uma sociedade altamente machista e intolerante.
É nesse “balaio de gato” que surgiu após os anos 60, com maior visibilidade a partir da década de 80, os superatletas, superstars e top models. Pessoas estas que, por se destacarem em suas atividades, sobretudo na música nas passarelas e nos esportes, (no Brasil um destaque especial para o futebol), passam a ganhar verdadeiras fortunas. O que provoca uma enorme mudança na vida, abrindo um enorme abismo entre a vida pobre (na maioria dos casos) que o atleta levava, e a rica que pode levar agora.
Em outras áreas também pessoas se destacam, se enriquecem e ganham notoriedade. Mas entre os jogadores de futebol e os cantores “sertanejos” as conquistas e mudanças são mais visíveis.
Um grande número de novos ricos para quem a fortuna veio muito “rápido”, sem que tivessem tempo de se prepararem para lidar com ela. E é inevitável o deslumbramento. Junte-se a isso a idéia que povoa o inconsciente coletivo, fortemente disseminado pelos veículos de massificação machista-consumistas, de que só justifica ter dinheiro se ele for usado para “pegar mulher”. Ou seja, temos pessoas que, como a maioria de nós, não cresceu em famílias sólidas e saudáveis, e que se tornaram milionários em 90 minutos, em uma sociedade que nos incentiva a comprar tudo que as vitrines exibem, e a sair com um parceiro diferente (de preferência no plural) a cada noite.
Esse é um lado da história. Do outro lado temos a vulgarização da figura feminina, criticada por todos, mas incentivada pelos mesmos, inclusive pelas próprias. Que não só coisificou o corpo da mulher, mas a tornou mero “objeto sensual”, para satisfazer a mentalidade machista dos homens, e das mulheres.
É verdade que algumas mulheres se “dão bem” ao se submeterem a esse regime. Mas a grande maioria apenas se transforma mesmo, em objeto nas mãos de machos que, em sendo inseguros com grande poder de compra e infelizes com grife, precisam “pagar” de grandes pegadores para se sentirem incluídos e respeitados. Para se sentirem homens.
Assim agem os solteiros, que caem na esbórnia de forma inconsequente e sem respeitar quem usa, já que é exatamente isso que faz, “usa”. E, como a família não tem mais nenhum valor para a maioria, assim também agem os que já tinham constituído uma família anteriormente, no tempo das vacas magras. Desrespeitando, também, pessoas que estiveram com ele em momentos difíceis, e que em alguns casos foram imprescindíveis para que alcançassem o sucesso. Em claro desrespeito da própria história. E o desrespeito é para com a própria família, e para a família das outras pessoas. Pois, muitos sequer procuram imaginar que consequências seus atos inescrupulosos provocará na vida de quem ama a pessoa eleita como objeto da vez, seja pais, filhos, cônjuges ou bons e fiéis amigos (algumas pessoas com caráter mais doente chegam a afirmar que “quem tem que se preocupar com os seus, é só a própria pessoa” e que ninguém mais pode ser responsabilizado pelos danos, como se sua filha adolescente for convencida, por um bandido qualquer, a assaltar um banco, a responsabilidade é só de sua filha, e que o bandido não tem culpa nenhuma em tudo que esse ato pode causar em sua família. Evidente que considero um grande erro, decorrente do estado de enfermidade que nos encontramos).
Para corroborar comigo, recorro ao que disse o golfista Tiger Woods: “O dinheiro e a fama faziam com que tudo, que fosse ruim, ficasse perto. Achava que não tinha limites. Feri quem amo”. (esclareço para os incautos, que porventura não tenham percebido, tanto essa citação quanto a que está no topo desse texto foram escolhidas por colaborar com o tema, mas há nos dois casos, uma altíssima dose de ironia).
E esse comportamento não é exclusividade dos nascidos com testículos. As mulheres, em sua busca por emancipação e igualdade, assimilaram também as características mais espúrias do comportamento machista. Afinal, se ela pode ter um carrão, um número cada vez maior de garotões estão se oferecendo nas baladas, e em todos os lugares.
E a Mulher, que sempre teve em suas mãos o controle das decisões no âmbito familiar, e nos rumos de toda sociedade, em sua busca por “igualdade” se perdeu um pouco. Por querer se tornar “poderosa” perdeu boa parte do poder que sempre foi dela, até por desígnios Divinos (Ah, esse adorável paradoxo do comportamento humano, que amo e odeio). Particularmente acho que as mudanças comportamentais provocadas pelo movimento de Leila Diniz e suas “companheiras” são responsáveis por grande parte dos problemas sociais que enfrentamos hoje. Não os ganhos que elas conseguiram, é claro. Mas, as grandes perdas que todos tivemos (isso é tema pra outra divagação).
É engraçado ver a reprodução desse universo em ambientes bem menos “glamourosos”. Hoje se um jovem joga um futebolzinho em algum clube de quinta divisão, ou canta, mesmo que só entre os amigos mais próximos e a família, logo terá algumas jovens garotas, e algumas não tão jovens assim, se oferecendo como o objeto que aprendeu a ser. (Sem citar o número enorme de anônimos que se esforçam para virar “celebridades” mesmo sem talento, para poderem ter o mesmo estilo de vida de seus ídolos).
Como o adultério não é novidade (opa, estou me repetindo), só que nunca esteve tão “na moda” como agora. Ou o leitor vai dizer que não concorda comigo, quando digo que os veículos de comunicação se esforçam muito para vender a idéia de que não há nada mais normal do que se ter um(a) amante? Quantas revistas que se ocupam apenas desse tema? E os programas noturnos de televisão, que entre uma banalidade e outra sempre enaltece a figura do adúltero. As novelas de todas emissoras então, não pregam outra coisa senão essa idéia, e mesmo quando tenta discutir coisas relevantes, não abandonam o incentivo à traição. E com isso vemos multiplicar as Betinas, Helenas e Gustavões em nosso meio (é o grande (de)serviço que a grande mídia se orgulha em nos prestar).
Quem não concorda com isso está errado, é atrasado, velho, careta ou conservador. E se alguém critica então, é acusado de ser contra a liberdade de expressão e favorável da censura. (Não sou partidário da censura, mas estou próximo a concordar que estou mesmo velho e careta. Melhor pra mim).
O problema não para por aí. Há ainda um outro agravante. O movimento pela banalização do desrespeito aos princípios que um dia existiram (mesmo que só teoricamente, como dirão alguns), criou um outro efeito estranho.
Como hoje o normal é não ter princípios, não respeitar valores, leis, costumes e, muito menos pessoas, quem procura viver fora desse padrão, é que se sente fora de contexto, errado, esquisito. E, pior ainda, o comportamento geral está definindo que é a vítima que deve sentir vergonha, e não quem comete o delito, seja ele qual for.
Não é estranho meus caros, ser o traído que se sente envergonhado, e não a pessoa sem princípios, autoestima, amor próprio e/ou vergonha na cara mesmo. Da mesma forma que é o extorquido que prefere se esconder para não ser motivo de chacota enquanto quem o extorquiu anda livremente, exibindo seu largo sorriso. Somos nós, eleitores que nos envergonhamos pelo que faz nossos representantes em Brasília, ou aqui mesmo, na Câmara de Vereadores.
Da mesma forma, boa parte das mulheres que são abusadas sexualmente não denuncia seus agressores, por vergonha. E também, o homem que é pego “de surpresa” por uma gravidez de uma amante, procura ocultar o fato, para não se comprometer (se é que ainda hoje alguém pode alegar ter sido pego de surpresa, e que alguma gravidez é inesperada).
Nós aprendemos também que a vergonha que nos é causada por alguma agressão (física ou moral), deve ser anulada por uma ação contrária. Ou seja, devemos ser machos (ou fêmeas) de verdade, e não levar desaforo pra casa, certo? Assim, se alguém comete um crime contra minha pessoa, eu devo praticar contra ela crime ainda maior, para que a vergonha dela seja maior que a minha, e assim eu “lavo minha honra”.
Assim, da combinação de todos esses fatores, resulta um crescente número de crimes ditos “passionais”. Além de cada vez mais mulheres sendo mutiladas em clínicas de aborto, pra esconder suas vergonhas.
Se Bruno é realmente culpado, ou inocente, ainda não temos o veredicto final. Mas o fato é que ele não precisava (na verdade não devia) estar passando por tudo isso. Não há justificativa para se tirar a vida de alguém. O erro começou quando Bruno, em sendo casado com Dayane, não respeitou a família da qual deveria ser “o chefe” e ser metade da referencia que orientará a formação de seus filhos.
Também a jovem Eliza certamente ainda estaria viva se tivesse optado por uma vida de mais autovalorização e respeito a si mesma e às outras pessoas. Além é claro, de respeito à família dela mesma e a dos outros.
Por sua vez, a traída Dayane, que era só mais uma vítima da falta de caráter de seu marido, não precisava ter se metido nesse imbróglio todo. Bastava ter tomado outro caminho. Ao contrário, preferiu se sentir envergonhada e foi “lavar sua honra”, ao que parece, participando da trama de horror de seu marido.
Tudo bem, vou “relativizar” um pouco agora. Esse comportamento é sim a regra, mas existem várias, e maravilhosas exceções. Também concordo que o aumento dos casos de crimes passionais não é a única consequência da falência da família. Há vários outros reflexos, alguns tão ou mais graves, mas não são objetos dessa conversa. Concordo também que, nem todos os crimes passionais têm a mesma raiz na origem. Porém, não estou tratando aqui dos casos patológicos, isso é coisa para psicólogo ou psicanalista (e eu deixo esse trabalho para o Dr. Marcelo Caixeta que, além de capacitado, escreve muito melhor que eu).
Apesar do foco nos atletas, reconheço que o comportamento apontado não fica restrito nesse grupo. Temos vários outros focos agudos dessa terrível doença. Como alguns jovens nascidos em famílias que só têm dinheiro, e por isso cresceram sem nenhum limite, achando que pode tudo, a qualquer tempo.
Também não estou afirmando que as mulheres são culpadas por todas as mazelas da humanidade. Nem seria louco a ponto de dizer isso. Afinal, não sou antropólogo, sociólogo, nem pedagogo historiador (...). E, principalmente por ser totalmente apaixonado pelas mulheres, suas formas, força, capacidade, sagaz perspicácia e todas as demais características que compõem o universo feminino. Nem tento definir posições masculinas ou femininas (isso deixo para meu amigo Nilton César, que tem mais leveza e acidez (outro paradoxo delicioso)). Tampouco quero usar o algum ponto de vista religioso (nesse caso prefiro as missivas do senhor Javier Godinho).
Isto posto, só me resta lembrar que somos seres dotados de livre-arbítrio, e somos totalmente responsáveis por todas as nossas escolhas. Por fim eu pergunto: Que mundo estamos construindo?
Alea jacta est