Como sabem, cá estou eu, em processo de reconstrução. Tentando me reencontrar após praticamente dois anos muito difíceis e o fim de mais uma relação.
Voltei
para Goiânia. Voltei perdido, muito perdido. Ainda estou. Mas vou me
reencontrando um pouco a cada dia, a cada momento com os velhos amigos e com os
novos que vão surgindo aos poucos. Também a cada nova sessão de terapia, a cada
lágrima que ainda insiste em cair, às vezes.
Foi
um fim. E todo fim é sempre complicado e por vezes dolorido. Esse último foi o
mais dolorido até aqui. Por vários motivos.
Sei
que em algum momento a dor dará lugar à outros sentimentos e, em seu lugar
ficarão lembranças, boas e ruins e algumas lições (eu espero). Até lá, percorro
o caminho do reencontro e da reconstrução.
Já
atravessei esse trecho antes. Tenho boa noção do que o caminho me oferece. Sei
que dói, mas escolho viver o mais intensamente esse percurso.
Estou
morando sozinho. Já consegui refazer alguns dos laços de antes de me mudar para
o interior. E já encontrei novas companhias de jornada. Algumas bem saudáveis,
outras tão ou mais feridas quanto eu estou. Mas todas me são apoio. Amizades
sempre são. Tenho uma nova gata, carinhosa e carente, que me faz companhia
quando estou em casa. Mas, moro sozinho. Não estou dividindo a casa com nenhum
outro humano.
E,
em alguns momentos, isso potencializa a força da solidão, realçando a forte
presença das novas ausências. E, para mim, momentos de arrumação da casa são
especialmente doloridos. Minha mente sempre dá um jeito de ficar comparando
como estou fazendo isso agora, com como “nós fazíamos” antes. E isso dói. Sinto
saudade. Quero compartilhar, discutir sobre onde cada coisa deve ficar.
Discordar, aceitar...
Ontem
pela manhã foi um desses dias. Precisei reorganizar a cozinha para organizar
melhor minha produção de donuts (essa é umas coisas boas que eu trouxe na velha
mochila). Enquanto empurrava, sozinho, a geladeira, minha pequena mesa de vidro
e um armário, novamente essa saudade bateu mais aguda. Como sempre um turbilhão
de lembranças me vindo à mente. Cenas de tantos momentos alegres, outros nem
tanto, mas compartilhados, portanto, felizes, passando em minha cabeça.
Novamente o nó, o amargo, a lágrima. Sentimento de falta, de frustração, de angústia,
de fracasso...
Porém,
dessa vez uma coisa foi diferente e pode ter mudado para sempre minha vida ou, no
mínimo, os momentos. É que, não sei bem por qual motivo, eu prestei mais
atenção nas imagens projetadas em minha mente, e das quais eu sinto tanta
saudade. E, ao fazer isso, uma chave foi acionada aqui dentro. Eu percebi que
minhas lágrimas não são apenas por meu último casamento. E nem o tem como
motivação, e sim, apenas o fim de relacionamentos com namoradas/esposas. O que
me dói, o que verdadeiramente me dói, e a saudade de mim mesmo. De todas as sensações
e sentimentos que eu experimentei em todos os momentos em que eu acreditei que
uma dimensão da minha vida estivesse resolvida. Exatamente essa dimensão que,
normalmente está relacionada com a presença de uma pessoa com quem se divide a
vida, mas não necessariamente depende da existência da “alma gêmea”. Que é a
dimensão que engloba a estabilidade doméstica. De moradia e agenda ligada à
casa. Está ligado muito mais diretamente ligada à existência de um lar, sendo
ele compartilhado, ou não, com um cônjuge.
Por
isso sinto saudade de quando me mudei pra casa da Cohacol, lá em Mineiros,
quando pela primeira vez, passei a ter um lugar que era meu. Na maior parte do
tempo eu não tinha namorada. Mas tinha minha casa, onde me sentia seguro,
livre, confortável, pleno. A casa estava sempre cheia de amigos. Era perfeito.
Minha vida estava resolvida. Durou menos de 3 anos e eu precisei ir embora. Foi
uma opção minha, desfazer aquele mundo perfeito. Apenas precisei partir.
Quando
me mudei para a velha casa 266 da Rua 239, aqui mesmo, no setor Universitário,
após alguns meses em outro endereço onde não me sentia tão bem, também me
trouxe a sensação de que as coisas estavam resolvidas. E foram 10 anos felizes,
com alguns momentos de menor alegria.
E
teve a subida ao altar, no início de 2008, iniciando um período curto dessa
segurança, Casamento que durou pouco, até começarmos a descobrir as diferenças
e não sermos capazes de nos adequar.
Depois
a relação intensa com a moça que foi comigo para o interior, mas que precisou
voltar. Não teve briga, não teve decepções nem comportamento sacana de nenhum
de nós. Apenas a relação chegou ao fim e ela precisava partir de lá. Doeu,
claro, mas era fácil entender e aceitar o fim.
Em
seguida, em meio à turbulência que estava minha vida, pela partida daquela
companheira, chegou a face mais presente em minhas saudades. Teve certa
intensidade. Foi bom. Trouxe a segurança e a paz que tanto me agrada. Novamente
acreditei que minha vida estivesse resolvida. Mas, dessa vez só eu vivi a
história dessa maneira. Mesmo assim, até que durou e acabou de forma dolorosa e
um tanto desagradável. Mas foi certeza para mim, então sinto falta. Sinto
saudade e, apesar de tudo, sinto que tenha terminado.
Em
todos esses momentos esteve presente minha felicidade e alegria em acreditar
que essa dimensão da minha vida estivesse resolvida, seja com uma companheira
ou sozinho, mas com um lar.
Gosto
de me sentir em casa. Gosto de ter a segurança de ter um porto seguro. Sim,
gosto de sair, de viajar, de ir. Mas gosto disso especialmente por ter pra onde
voltar. Ter a segurança de saber que, quando a aventura não for mais divertida,
ou o trabalho for concluído, existe uma porta que se abre com minha chave e
esse lugar está sempre pronto a me acolher. É disso que sempre senti falta,
saudade.
Gosto
das pessoas? Claro. Amo/amei cada mulher que esteve ao meu lado, ao longo dessa
minha vida simples? Pode apostar que sim. E sigo amando cada uma, de maneira
carinhosa e saudável. E sim, sinto saudade dos bons momentos que passei com
cada uma. Mas o que percebi ontem é que nunca foi exatamente isso que me tira
lágrimas. Minhas ex-companheiras estão em lugar seguro, dentro de mim, de
maneira a continuarem me ensinando as lições de cada etapa, mas sem me ferir,
nem ser ferida por mim.
Mas
a sensação de LAR, que construí com cada uma, e que não existe mais, é o que me
dói. Assim como a mesma sensação que criei sozinho, em alguns momentos.
E
perceber isso é libertador. Me liberta da mulher que empresta o rosto aos meus
momentos de solidão e angústia, nesse momento. Pois o que eu realmente busco
não é ela. É o ambiente, a atmosfera que criamos, no caso da última relação,
que eu acreditei, sozinho, que existia.
Essa
percepção também liberta a pessoa, pois me leva a liberá-la de toda
responsabilidade e culpa pela dor que eu possa estar sentindo.
Entendo
as mudanças. Gosto da perenidade da inconstância que a vida é, e precisa ser.
Mas também gosto de algumas certezas e seguranças. É importante ter pra onde
voltar. Ter alguém esperando dá um conforto extra, que torna a vida bem melhor.
Mas a vida sempre encontra alguma encruzilhada e muda as histórias. Nos faz
querer ir, ou ter que ir mesmo sem vontade. Por vezes, temos que deixar o porto
e navegar em águas turbulentas, ou com extrema calmaria, quase sempre
parcialmente desconhecidas e, quando não há porto pra onde se pode voltar e
atracar, qualquer navegante se sente perdido, à deriva.
O
problema de hoje não é estar sozinho na casa em que estou. É não ter, ainda,
construído a atmosfera de lar. Ainda não me sinto completamente em casa aqui e,
até que isso aconteça, vou continuar sentindo essa saudade que usa rosto,
perfume, textura de pele e tom de voz, para me enganar, pois, na verdade, sinto
saudades de mim mesmo, dos momentos em que soube, ou acreditei, que eu tinha um
LAR.
Goiânia,
08/12/2021
Naza
Poeta/escritor,
apaixonado
Ferido
em recuperação
Uau, que texto lindo, profundo e verdadeiro, cheio de consciência e auto aceitação. Me reconheci muito nele. Obrigado por compartilhar.
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